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segunda-feira, 16 de outubro de 2017

O RELEVANTE PAPEL DA ENFERMAGEM NA ATENÇÃO BÁSICA DO SUS



Não foi sem espanto que recebemos a decisão liminar do MM. Juiz da 20ª Vara Federal do Distrito Federal, proferida nos autos do processo judicial nº 1006566-69.2017.4.01.3400, de autoria do CFM, contra atividades realizadas pelos enfermeiros no âmbito do SUS.

Os enfermeiros exercem papel fundamental na saúde pública, em especial na atenção básica, que tem como objetivo primeiro, a promoção e proteção da saúde, sem descuidar de suas funções curativas básicas e de seu essencial papel de ordenar as referências entre os diversos serviços nas redes de atenção à saúde.

Cabe destacar que suas ações estão previstas na Lei federal nª 7.498/1986, que regulamenta o exercício da profissão, definindo ser “privativa do enfermeiro a realização de consultas de Enfermagem e a prescrição de medicamentos estabelecidos em programas de saúde pública e em rotina aprovada pela instituição de saúde”.

O posicionamento das entidades representativas da enfermagem, como também de gestores estaduais, municipais e diversos seguimentos do próprio movimento médico em relação à medida liminar que suspende “parcialmente a Portaria nº 2.488 de 2011”, é de que ela trará enorme prejuízo à população, em especial a mais carente e dependente do SUS.

Não bastassem os problemas que a sociedade enfrenta em relação às grandes iniquidades sociais dadas as profundas desigualdades de nossa sociedade, o país ainda convive com a falta de formação dos profissionais da saúde, em particular da profissão médica, para o SUS.

A lei do ato médico, na contramão do SUS, não engrandece a categoria e peca contra a prática interprofissional e multidisciplinar, que tem na atenção básica o seu principal espaço de interlocução, por ser a porta de entrada e a ordenadora do fluxo das necessidades de saúde das pessoas para as redes de atenção nas regiões de saúde.

Importante dizer que a saúde da família atua sob o enfoque do trabalho em equipe, com a participação do médico garantindo a segurança na atenção das práticas de saúde, sendo relevante a atuação da enfermagem na equipe para a continuidade do cuidado com a saúde. Não se garante integralidade da assistência com a reserva de atribuições de atendimentos básicos ao médico quando ela pode ser exercida pelos enfermeiros e enfermeiras de modo seguro e competente.

É bom lembrar que recentemente foi preciso trazer médicos de outros países e desenvolver mecanismos para induzir a ida de médicos brasileiros para os lugares mais longínquos e periféricos do pais, pelo Programa Mais Médicos. Os objetivos eram o de atender as necessidades básicas de saúde das pessoas residentes nesses territórios e melhorar a prática profissional nas faculdades de medicina.

Será exatamente essa população a sofrer revés no cuidado de sua saúde, caso a medida liminar perdure, ou se o mérito da ação vier a proibir a atuação do profissional da enfermagem na saúde da família, nos termos da Portaria Ministerial suspensa. 

Se já não bastasse conviver com um sistema de saúde subfinanciado[i], que aplica em relação a outros países, valores muito inferiores, atitudes que buscam ampliar a reserva de mercado a qualquer profissão é contraproducente, e está na contramão de países como Canadá, Portugal e Inglaterra, dentre outros, que adotam práticas mais abertas no que tange ao papel da enfermagem.

Tal decisão liminar em ação proposta pelo Conselho Federal de Medicina contribui para o enfraquecimento do Sistema Único de Saúde, prestes a completar 30 anos de luta e realizações; interpretações dúbias desestabilizam o trabalho das equipes de saúde da família, trazendo insegurança jurídica para os gestores do SUS, afrontando o princípio do pleno exercício de uma profissão essencial para a garantia do acesso aos serviços de saúde, prejudicando o atendimento de milhões de pessoas que procuram todos os dias as unidades básicas de saúde no pais, agravando ainda mais os problemas da saúde pública.

Esperamos que o bom senso, a razoabilidade jurídica prevaleçam sobre interpretações que não condizem com o avanço das tecnologias de saúde que exigem interpretação renovadas das normas de saúde.


[i] A diferença é que a Inglaterra aplica 7,0% de seu PIB em saúde pública e 3.235 dólares per capita ano enquanto o Brasil aplica 3,9% do PIB em saúde pública e R$1.100,00 per capita/ano (base 2012). (www.oecd.org/els/health-systems/health-data-htm)

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